Ler & Pensar | Quem não matou Odete Roitman?



O cronista Sérgio Ayres revela quem não matou a maior vilã das novelas brasileiras

As duas versões de Odete Roitman: Débora Bloch (2025) e Beatriz Segall (1988/9

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Sérgio Cardoso Ayres

MEMBRO DA ACADEMIA BARBACENENSE DE LETRAS

 

Marco Aurélio, Celina, César, Maria de Fátima e Heleninha. De acordo com a imprensa e as redes sociais, que erram sempre, esses são os cinco suspeitos de tentar matar Odete Roitman. Ela é aquela personagem que resume tudo de mal que pode existir num ser noveleiro, além de mestra em frieza e elegância, sendo considerada a vilã número um do país na telinha da TV – que hoje tem mais de 50 polegadas e 4K. Mas, atenção, eu disse tentar matar pois nada garante que ela morreu mesmo. Afinal, vale qualquer coisa por likes ou audiência. E homicídio e tentativa são duas coisas diferentes, como alguns afirmam que não é crime planejar um golpe militar se ele não aconteceu, como fez o filho zero alguma coisa. Dá para entender essas modernidades?

Eu confesso que não assisti a nenhum capítulo dessa nova versão da novela, mas assumo que segui, meio assim de longe, a novela Vale Tudo original muitos anos atrás. A cena do crime foi ao ar, antes se dizia assim, às vésperas do Natal de 1988. E o suspense durou cerca de onze dias. Nela, a assassina de Odete foi Leila, interpretada pela atriz Cássia Kiss, essa mesma que foi a maior apoiadora de Bolsonaro no meio artístico, junto com a ex-namoradinha do Brasil, a ingênua Regina Duarte. Se o tempo é implacável até mesmo com as novelas, o que dizer com a realidade! Inclusive, a atriz da verdadeira Odete Roitman foi Beatriz Segall, que faleceu em 2018 e escapou de assistir à nova versão requentada. Hoje, a megera é interpretada por Débora Bloch, que já foi Bete Balanço no cinema! A vida é assim: vilã morta, vilã posta.

Nessa releitura, motivada pela ausência de roteiros de teledramaturgia interessantes e atuais, Manuela Dias, autora da trama, prometeu um assassino diferente da versão original. Ou seja, Odete Roitman vai morrer duas vezes e pelas mãos de dois assassinos diferentes. E é exatamente aqui que começou a minha curiosidade. O filósofo Walter Benjamim afirmou que existe mais presente no passado do que se imagina. Ou seja, traduzindo, muito mais presente no passado do que passado no presente. Dessa forma, fico questionando essa mudança no passado e de forma tão grosseira. Para mim, precisamos pesquisar o presente para justificar essa alteração e suas razões e motivos. Como ainda vivemos numa época em que nada se cria e tudo se copia, frase famosa do saudoso Chacrinha, filósofo mais importante do que Lavoisier, que acreditava que tudo se transformava, alterar um fato não é mais nenhum tabu, já que a Inteligência Artificial está aí para o que der e vier; colorir, movimentar, apagar e, principalmente, alterar. Não sei como vai ficar a justiça, agora que a Leila vai ser inocentada de matar Beatriz Segall, ou melhor, Odete Roitman, já que existe uma nova versão para o crime, com um novo assassino, se é que a Odete morreu mesmo. Fato é que nenhuma vítima pode ser assassinada duas vezes. E nenhum morto pode ser assassinado por pessoas diferentes.

A morte de Odete Roitman, longe do crime cometido por Charles Mason, assassino de Sharon Tate, e por Brutus, de César, inverteu os papéis principais. Nos dois exemplos, quem morreu foi o inocente e quem matou foi o bandido. Na de Odete, morreu a vilã e o assassino foi o bonzinho. Na verdade, existem duas formas de morte: a matada, que foi a de Odete Roitman na versão original. E a morte morrida, que foi a de Beatriz Segall, a atriz original. Ou seja, ficção e realidade, que não se bicam muito atualmente, com a segunda superando a primeira em gênero, número e audiência.

Se eu fosse o autor desse drama, depois da conclusão da refilmagem, quando descobriremos quem matou pela segunda vez a vilã, e que não foi o primeiro assassino, lançaria a terceira versão de Vale Tudo. Nela, Odete Roitman ressuscitaria e, numa espécie de Frankenstein feminino, perseguiria o seu assassino, que na realidade seria Manuela Dias, autora da trama, que viraria Mary Shelley na ficção, autora de Frankenstein, interpretada por Bruna Marquezine. E Odete Roitman, na terceira versão, seria uma criação da Inteligência Artificial. Por isso mesmo, não existiria e nem poderia ser assassinada pela terceira ver.

Ah quase esqueci o nome para a nova versão: Não Valeu a Pena!

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