Paulo Maia Lopes
Médico, historiador e pesquisador
A viagem tinha sido atemorizante. Os oitenta homens de Colombo, mal instalados em três caravelas frágeis, enfrentavam há dois meses as incertezas do mar. Não sabiam onde estavam, pois a longitude era difícil de medir só com as precárias ampulhetas e a observação do céu. Tinham a vaga promessa do Almirante de que Cipango (o Japão) os esperava logo adiante, baseada numa estimativa otimista da circunferência da Terra. Houve tentativas de revolta, desejo de voltar à Espanha, medo crescente do desconhecido. Afinal, na noite de 11 de outubro de 1492, Rodrigo de Triana, grumete de vigia a bordo da “Pinta”, com a vista afiada dos jovens, de olho no horizonte e na milionária recompensa prometida pela Rainha Isabel de Castela a quem primeiro descobrisse ilhas ou penínsulas, avistou uma sombra inconfundível à luz do luar: “Tierra! Tierra!” A frota de Cristóvão Colombo, na manhã seguinte, aportava na América, pensando ter encontrado o caminho ocidental para as sonhadas Índias.
O navegante levara dez anos tentando convencer os reis de Portugal, França, Aragão e Castela a lhe financiarem a viagem, não com o argumento, como popularmente se pensa, de que a terra era redonda (fato conhecido por todas as pessoas cultas desde a Antiga Grécia), mas de que era pequena. Afirmava que a distância entre as ilhas Canárias e a Índia, navegando para o ocidente, era de apenas 3550 milhas náuticas, a quarta parte do número real. Isabel, a Católica, resolveu dar-lhe uma oportunidade. Os geógrafos e astrônomos da corte, melhor informados das cifras verdadeiras, preveniram a rainha de que tal viagem levaria cerca de três anos, prazo em que a tripulação estaria morta de fome ou de escorbuto. Colombo retrucou que a Terra tinha a forma de uma pêra, larga no centro e afilada na ponta superior. Por este caminho menor é que seguiria. A rainha o deixou ir. Se não tivesse encontrado a América no meio, levaria certamente seus homens à morte.
Para a Espanha de 1492, que acabara de unificar-se pelo casamento da rainha Isabel I de Castela com o rei Fernando V de Aragão, e que expulsara os mouros de Granada, seu último baluarte na Península Ibérica, era fundamental que Colombo ganhasse sua aposta. O caminho terrestre para o Oriente, a famosa ”Rota da Seda” para a China, por onde trafegava a riqueza do comércio em artigos raros, estava praticamente fechado após a tomada de Constantinopla pelos turcos (1453), devido à retirada dos potentados mongóis frente ao Império islâmico em expansão, à insegurança e à Peste Negra. A rota pelo mar, costeando a África, já fora dominada pelos rivais portugueses, inspirados pelo sábio infante Dom Henrique e sua Escola de Sagres: Em 1888 Bartolomeu Dias dobrara o Cabo da Boa Esperança, e em 1498 Vasco da Gama chegaria à Índia. O sonho de Colombo, por temerário que parecesse, era a única opção espanhola.
No final de sua vida, o grande navegador ficaria inteiramente doido, mas parece que não era precisamente esse o caso, antes de sair em sua aventura pelo mar desconhecido. Há documentos mostrando que ele visitou a Islândia e talvez tenha tomado conhecimento das sagas nórdicas, relatando as viagens dos “vikings” pelo Atlântico e as terras que visitaram a oeste. Desse modo, se não podia imaginar um continente a meio caminho das Índias, podia contar com locais de parada e reabastecimento.
As informações sobre a juventude de Colombo são escassas e de pouca credibilidade, por procederem em sua maioria da “Historia del Almirante”, escrita por seu filho Fernando, uma mistura de fatos verídicos com os episódios mais fantásticos. Parece que trabalhou junto ao pai, tecelão de ofício, antes de se fazer ao mar, perto dos dezoito anos. Tinha nascido em 1451, em Gênova, uma cidade-estado italiana de grande tradição marítima. Cristóvão aprendeu sem dificuldade as artes da navegação e da cartografia, de maneira autodidata.